ao burocrata
Antonio Miranda Fernandes

tudo preciso, 
sem nenhuma hesitação,
nenhum erro, inimitável,
burocrata insubstituível

números crescem ou diminuem,
incham, amolecem como o sexo
arfando sob o silêncio noturno
(quem tem tempo para isso?)

carrega a ganância, o ódio 
pratica a rapina, tudo por escrito
na mesma palavra, mesmo peso, 
olho por olho na usura.

poesia, lirismo, amor? ora por favor...
(quem tem tempo para isso?)
tempo ignorando o seu bojo
a dor, um odor azedo e morno
a morte no sábado
enterro no domingo
sem desordem no andamento
eu sendo a exceção da regra
tive que velar seu corpo frio
sentir saudades, balbuciar rezas,
estragando meu final de semana
(tive que arrumar tempo para isso!)